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O valor da prevenção

Entrevista com José Carlos Felner – Presidente da GSK Brasil

Imagine a solidez de uma empresa farmacêutica que deu seu primeiro passo em 1715, com a abertura de uma farmácia em Londres. E que, desde então, graças a pesados investimentos, ciência de primeira, fusões e aquisições, se preocupa obsessivamente com a saúde das pessoas dos países em que atua – por meio, sobretudo, do desenvolvimento de dezenas de vacinas e centenas de medicamentos de alta tecnologia, sem deixar de lado os produtos mais populares, como o célebre sal de fruta ENO. Com essa missão no seu horizonte permanente, está entre as dez maiores empresas farmacêuticas do mundo. Imagine também a responsabilidade e as credenciais de quem preside qualquer uma das filiais da GlaxoSmithKline, a GSK, pelo mundo. É o caso do presidente da GSK Brasil, José Carlos Felner – um imigrante moçambicano que, no fim da década de 70, encontrou abrigo aqui como opção à guerra civil em seu país. Ele vai completar 40 anos de empresa, que tem sede nacional no Rio de Janeiro, com a proficiência de um veterano e o entusiasmo de um iniciante. No ano da pandemia, reforçou seu plano de investimentos – e manteve os lançamentos previstos, como a de medicamento que vem beneficiar os pacientes com sofrimento pulmonar. Aliás, a linha respiratória – que já incluía, por exemplo, os clássicos Aerolin, Seratide e Volibris – há 50 anos é um dos fortes da marca. Claro, numa empresa que aposta boa parte de suas fichas na prevenção, uma vacina contra a Covid-19 terá também a marca e o prestígio da GSK.

Sua trajetória no mercado farmacêutico brasileiro é mais ou menos longa…

Tenho 44 anos de indústria farmacêutica e em janei- ro vou fazer 40 de GSK Brasil. Vim como refugiado, trabalhei em posto de gasolina e comecei a traba- lhar no setor como representante comercial numa outra indústria farmacêutica, e depois em outra, na área hospitalar. Então fui chamado para trabalhar na GSK, mais precisamente no relançamento do Amo- xil, um antibiótico de referência no mercado. Tive todas as experiências possíveis como representante comercial até chegar à década de 90 – quando eu já ocupava o posto de diretor comercial da GSK, ainda bastante jovem, na casa dos 30 anos. Além da parte comercial da empresa, fui responsável por outras funções, como logística, treinamento da força de vendas, etc. Nos lançamentos de nossas vacinas – contra gripe, hepatite C, etc – fui me apaixonando pela área de prevenção de doenças. Nos anos 2000, fui responsável por montar a primeira unidade exclusiva de vacinas da GSK, que foi progredindo no mercado de vacinas público-privado, sendo hoje responsável por 70% desse mercado: a cada segundo, são distribuídas três doses de vacinas GSK.

Aliás, vocês foram responsáveis por produzir 42 milhões de vacinas utilizadas na campanha contra a gripe H1N1, não?

Sim, fomos os principais fornecedores do Ministério da Saúde, junto com o Instituto Butantan, e assim foi prevenida a pandemia então anunciada.

que você falou em pandemia, é inevitável falarmos da Covid-19. Vocês fizeram várias parcerias para o desenvolvimento de uma vacina contra o novo coronavírus. Dessas, o trabalho conjunto com a Sanofi-Pasteur é mesmo o mais promissor?

É, na forma como a gente vê a vacinação. Há três formas de contágios infecciosos – os surtos, bem localizados, epidemias, que atacam grande número de indivíduos em determinado local, e pandemias globais como esta. Quando se busca uma vacina pandêmica, a pesquisa é completamente diferente de quando se está atrás de uma imunização para surtos e epidemias. A gente utiliza tecnologias que já dominamos – mas não basta desenvolver uma vacina, ela precisa ser fabricada em larga escala, na casa dos bilhões, e dentro de padrões muito especiais. Se você não é capaz de gerar uma vacina sustentavelmente eficaz e segura ao longo do tempo, logo vai ter que vacinar todo mundo de novo. Isso estressa o sistema todo. E é preciso levar em conta também os requisitos logísticos da vacina, para transportá-la de maneira segura, conservada em temperaturas negativas o tempo inteiro, até a aplicação em pessoas. Vacinas pandêmicas têm que seguir uma série de pré-requisitos especiais para serem viáveis globalmente, começando pela eficácia imunizante testada sem pontos de interrogação quanto à segurança – em relação, também, a possíveis efeitos colaterais. Imagine injetar em bilhões de pessoas saudáveis, em todo o mundo, um produto biológico sobre o qual ainda pairam dúvidas e incertezas, acreditando que você as estaria protegendo – e surjam efeitos colaterais importantes. Como é que se controlariam esses efeitos, em termos de farmacovigilância, e se corrigiria isso? Não pode haver dúvidas. E é absolutamente necessário haver um parque industrial à altura dessa responsabilidade. Aí entram a GSK e a Sanofi-Pasteur, as duas maiores empresas de vacinas do mundo. Só a GSK tem em seu portfólio 30 vacinas e ainda detém a plataforma tecnológica de adjuvantes, que possibilitam o uso de uma menor quantidade de antígeno por dose de vacina, o que pode fazer toda a diferença em uma pandemia. Juntando nossos parques industriais, conseguimos confeccionar bilhões de doses – e engajados num programa globalizado que vai democratizar o acesso à vacina.

Com sua experiência no campo da imunização e seu feeling como veterano do setor, para quando você estima, realisticamente, uma vacina global eficiente contra a Covid-19?

Pessoalmente tenho dito à minha família que devemos nos proteger de outras formas até 2022. De qualquer modo, paralelamente à vacina, a GSK está investindo no desenvolvimento de dois medicamentos imunobiológicos contra a Covid-19–sobre os quais haverá notícias em poucas semanas. Ainda com base em minha experiência, digo o seguinte: nosso sucesso em conviver bem com a Covid-19, como já fazemos hoje com outros agentes infecciosos, como o vírus da gripe, depende de três elementos: nossos fatores individuais e coletivos de proteção imunológica, que iremos desenvolver até o surgimento da vacinação em massa, medicamentos e técnicas de higienização mais eficientes. E então a Covid-19 será uma lembrança do passado. Até 2022, vamos nos adaptando e convivendo com ela.

Aliás, a GSK, desde o início da pandemia, tomou uma série de medidas para proteger seu pessoal e outros players do mercado – como oferecer cursos de requalificação a seus colaboradores e antecipação de pagamento a seus pequenos fornecedores. Como isso foi planejado?

No dia 12 de março, fui para casa e tive uma noite com meu travesseiro para encontrar medidas que amenizassem os efeitos destrutivos do novo inimigo. Apesar de meus mais de 40 anos de mercado farmacêutico, eu não tinha um manual para lidar com isso. No dia seguinte, dei liberdade para cada presidente local da empresa tomar suas decisões. E a primeira foi esta: dia 14 de março, já estava todo mundo em casa, a fábrica só operando para evitar ruptura do suprimento de mercado, sobretudo no campo das vacinas. Nossa cultura sempre foi a colaboração, começando pela cessão de tecnologias. Nesse caso, decidimos cuidar de nossos funcionários, de nossos clientes e de nossos fornecedores. Não demitimos ninguém e fizemos o adiantamento de pagamentos aos que dependiam mais diretamente de nós. Mas você pergunta como isso foi planejado e eu respondo: começou há dois anos, quando evidentemente não se conhecia a Covid-19. Em 2018, tomamos a decisão de inovar a companhia, torná-la mais flexível. Graças a isso, iríamos passar muito bem pela Covid-19. Não cortamos empregos e não reduzimos nossos investimentos. E esta semana aprovamos nosso plano de investimentos adicionais para o ano que vem. Vamos investir, em 2021, 20% mais do que neste ano nas nossas principais áreas – em meio à Covid-19, lançamos nossa unidade de oncologia, com um pipeline enorme de novos produtos. Contratamos pessoas de forma remota. A diretora de negócios dessa unidade oncológica, contratada há dois meses, conheci semana passada.

Que medidas foram tomadas em 2018 que anteciparam o “novo normal”?

Não mais assinaturas em papel, por exemplo. Em dezembro de 2018, assinamos nosso último papel. Flexibilidade de horários, pessoas trabalhando em casa. Veja como são as coisas. Em dezembro do ano passado, fizemos uma simulação para descobrir se a empresa conseguiria funcionar de forma remota. Conseguimos, sem ninguém no escritório. Passamos no teste, com pequenas correções – uma antecipação do que faríamos na quarentena. Também investimos fortemente em inovação e simplificação de processos internos e externos, por meio de parcerias com startups que estão nos apoiando em soluções para diversos desafios da companhia.

Uma das unidades mais fortes da GSK, há 50 anos, é a área de produtos respiratórios. E vocês estão lançando um novo medicamento, o Trelegy – arma ainda mais poderosa contra a temível DPOC. Em que ele inova?

Não tínhamos ainda os três princípios ativos mais eficientes contra a DPOC (furoato de fluticasona/ umeclidínio/vilanterol) reunidos num único pro- duto. A eficácia da terapia será maior e haverá mais segurança, facilitando a adesão ao tratamento, com uma só aplicação. Lançamos o Trelegy em meio à Covid-19 porque confiamos muito no sucesso desse medicamento. Colocamos o produto muito bem nas farmácias – e ele já é líder do mercado em sua classe.

No caso de um medicamento com essa forma de inovação, ainda demora muito até chegar ao SUS e se tornar mais acessível à população?

Uma das razões para eu ter chegado à presidência da GSK Brasil é que, nas unidades de negócios onde trabalhei, sempre busquei, como compromisso pessoal, o maior acesso público possível. Assim foi com vacinas e medicamentos anti-HIV – nos quais temos 50% do mercado hoje. A GSK tem essa pegada universal no mundo. Por seis anos consecutivos, lideramos o Access to Medicine Index, ranking que identifica as melhores práticas das farmacêuticas para promover o acesso a medicamentos nos países em desenvolvimento. Nenhum medicamento inovador se justifica sem que os produtores façam o máximo para que o maior número de pessoas se beneficiem dele. E isso exige vários modelos colaborativos de produção, mas não na fórmula tradicional “alto custo, baixo volume”. Desde o primeiro dia, temos como objetivo incluir o Trelegy num sistema de acesso público. Leva um pouco mais de tempo entrar na plataforma do SUS, mas vamos chegar lá.

A Anvisa, a seu ver, aprimorou seus métodos de liberação de novos medicamentos?

A Anvisa está de parabéns. Nos últimos três anos, a mudança foi da água para o vinho nos tempos de resposta – seja numa inspeção ou na aprovação de novo produto, tudo é preciso e dinâmico. E, quando há dúvidas, as perguntas são sempre pertinentes, bem elaboradas. No caso da Covid-19, a Anvisa respondeu muito bem. Na GSK, temos 15 vacinas em nosso portfólio e 30 medicamentos novos em áreas complexas, como imunoterapia. A Anvisa não parou. Está tudo resolvido? Ainda não, mas posso testemunhar que não esperava ver tamanha evolução nos últimos cinco anos. Novas tecnologias exigem novos desafios e novas avaliações. Mas já virou a chave da inércia do passado.

Ainda em meio à pandemia, você consegue vislumbrar o ano de 2021 para a GSK em termos de faturamento e crescimento?

No nosso plano aprovado para 2021, esperamos crescer uma vez e meia a mais que o mercado farmacêutico – daí nossos recentes investimentos. Desde 2018 estamos com investimentos fortes na área respiratória, de vacinas, unidade de oncologia e num novo medicamento contra o HIV, em aliança estratégica com Farmanguinhos (combinação do antirretroviral Dolutegravir 50 mg e Lamivudina 300 mg em dose única diária). Estamos também investindo na saúde do homem, com um medicamento para problemas da próstata mais barato do que os disponíveis hoje no mercado. Enfim, estamos mantendo nosso plano de dobrar a companhia até 2022 com base em 2017. Nossos acionistas têm muita confiança no mercado brasileiro.

 

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