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Telas eletrônicas: Olhos abertos para o stress visual

Por Celso Arnaldo Araujo

Muitos oftalmologistas defendem a realização de um exame de vista nas crianças, na volta às aulas, após as férias regulamentares – porque esse período de mais tempo em casa, com os olhos fixados no videogame, no celular e no computador, pode levar à chamada miopia acomodativa, ou a dificuldade temporária de enxergar de longe. E, em alguns casos, ao aumento efetivo do grau de miopia já instalada. A pandemia certamente agravou o quadro. O confinamento das crianças em casa  por quase dois anos certamente contribuiu para a epidemia dessa “miopia doméstica” em crianças – por conta da chamada “síndrome das telas”. E essa situação exige a intervenção dos pais para ser prevenida. É o que explica o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, do Instituto Burnier, de Campinas. São informações preciosas para os profissionais de farmácia, que com elas podem prevenir, detectar e tratar a visão de suas crianças

Para início de conversa, é preciso observar que a miopia normalmente já aparece na infância – e é causada por fatores genéticos e ambientais que fazem o olho crescer mais que o normal. “Por isso, as imagens se formam à frente da retina e os míopes enxergam embaçado tudo o que está distante”, explica o oftalmologista. Ele está entre os especialistas que defendem a obrigatoriedade de um exame de vista na volta às aulas – e ainda mais na pós-pandemia. Isso porque o uso abusivo do videogame, celular e computador durante as férias pode levar à miopia acomodativa, dificuldade temporária de enxergar de longe, e a um aumento do grau de miopia já diagnosticada. Esta é a principal conclusão de um estudo com 360 crianças realizado pelo Dr. Leôncio Queiroz Neto muito antes do começo da pandemia. Para se ter ideia, dos participantes da pesquisa 21% apresentaram miopia contra 12% apontados pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO). Um dos dados mais alarmantes desse estudo: telas digitais usadas por até seis horas contínuas praticamente dobra a incidência de miopia. No grupo pesquisado, passou de 12% para 21%.O oftalmologista reforça: a chamada miopia acomodativa, que ultrapassa os padrões “naturais” desse distúrbio de visão, é provocada pelo excesso de esforço visual para perto. “O estresse diminui a flexibilidade dos músculos ciliares que permitem ao cristalino, lente interna do olho, mudar automaticamente o foco visual para perto, meia distância e longe”. Para que essa miopia temporária não se torne um mal permanente, e já lidando com os efeitos do isolamento social que ultrapassa os três meses e, no caso das crianças, talvez se estenda por muitas semanas, o oftalmologista de Campinas recomenda, como medida preventiva básica, ensinar a criança a olhar em pequenos intervalos de tempo para um ponto distante ou descansar os olhos de 15 a 30 minutos a cada hora de uso dos equipamentos.

Maioria nunca foi ao oftalmologista

Segundo o Dr. Queiroz Neto, que nem sempre a criança sabe avaliar a piora da visão por não ter uma referência – além disso, a alteração visual costuma ser lenta e progressiva. Crianças que não enxergam bem têm dificuldade no aprendizado, na socialização e são mais agitadas. A estimativa do CBO é de que 20% precisam usar óculos de grau. A primeira consulta com um oftalmologista, ressalta ele, deve ser feita aos três anos, quando os pais não usam óculos – e aos dois anos, quando usam. Nossos olhos se desenvolvem até a idade de oito anos e qualquer bloqueio visual nesse período faz o cérebro anular o olho de menor visão para usar o melhor. “O resultado é o “olho preguiçoso” ou ambliopia, maior causa de cegueira monocular entre crianças”, afirma o médico. A única forma de eliminar esse problema é ocluir o olho de melhor visão com um tampão para estimular o desenvolvimento do olho mais fraco. O tratamento só tem efeito se for realizado antes dos oito anos, quando se completa o desenvolvimento do sistema ocular.

Dicas do médico para descobrir se a criança tem algum problema de visão que requer consulta imediata:

Até dois anos: não reage a estímulos luminosos como, por exemplo, a luz do quarto que se acende. Lacrimeja excessivamente de um ou ambos os olhos. Fica muito tempo com os olhos fechados. Não demonstra interesse pelo ambiente à sua volta. Não ergue a cabeça para tentar ver objetos (brinquedos, por exemplo). Apresenta um ou ambos os olhos desviados para o nariz ou para fora. Reflexo luminoso na pupila como se fossem “olhos de gato”.

Dos três aos cinco anos: apresenta um ou ambos os olhos desviados para o nariz ou para fora. Cai com frequência. Se aproxima muito da TV para assistir. Inclina a cabeça para um dos lados ou para um ombro. Vira um dos olhos para fora quando está distraída, pensativa ou em locais muito abertos. Fecha um dos olhos em locais ensolarados. Coça muito os olhos, especialmente quando manipula o celular ou assiste TV. Queixa-se de visão dupla ou embaralhada

No início da alfabetização: faz careta ou franze a testa para enxergar. Queixa-se de dor ou cansaço nos olhos e dor de cabeça. Os olhos ficam vermelhos quando esforça a visão, mesmo sem coçá-los. Chega o rosto muito próximo ao caderno ou livro. Tem dificuldade em distinguir ou combinar cores.

Na quarentena

Nesse período, o impacto das telas eletrônicas foi evidentemente maior, pelo aumento do número de horas diante dos aparelhos digitais. Segundo o oftalmologista, a boa notícia é que, na maioria dos casos, não ocorreu por isso um aumento do grau dos óculos ou lente de contato que as crianças já usavam. Geralmente, foi um stress visual ou CVS (Computer Vision Syndrome) decorrente de muitas horas com os olhos fixos nas telas digitais. O problema maior é que esse quadro se estendeu pós-pandemia. Há crianças – e os respectivos pais sabem disso – que passam horas, quase sem piscar, diante das telas eletrônicas quando não estão na escola – ou até quando estão na classe, longe dos olhos vigilantes das professoras. Os principais sintomas desse stress visual são sensação de areia nos olhos, visão embaçada e dor de cabeça – o que faz quem já usa óculos para corrigir miopia, hipermetropia ou astigmatismo acreditar que o vício refrativo aumentou. “A visão embaça porque na frente dos dispositivos movimentamos pouco o globo ocular e piscamos quatro vezes menos – entre cinco a seis vezes/minuto, contra 20/minuto normalmente. Isso resseca a lágrima e causa sensação de areia nos olhos”, explica ele. Outro fator importante são as 16,7 milhões de cores geradas pelas telas dos equipamentos. A grande variação de luminosidade sobrecarrega o chamado esfíncter iriano, musculatura que regula a entrada de luz até a retina, onde são formadas as imagens. Um detalhe: a exposição ao sol limita a progressão da miopia, por ativar a produção de dopamina, hormônio do bem-estar que ajuda a controlar o crescimento do olho. Por isso, as crianças devem ser estimuladas a tomar 15 minutos/dia de sol sem usar filtro solar, ainda que seja na varanda do apartamento, se não têm como ir às ruas em dias úteis.

Risco da tecnologia

Crianças em casa por longas horas, claro, tendem a usar abusivamente o celular e outras telas digitais – o que requer controle dos pais. E mais: a OMS preconiza desligar todos os equipamentos de informática duas horas antes de dormir. Isso porque, a luz azul emitida pelas telas digitais tem o mesmo comprimento da luz invisível que predomina durante o dia. Por isso, ela diminui a produção de melatonina, hormônio indutor do sono. Além da insônia, a exposição à luz azul durante a noite interfere na saúde óssea das crianças.

PARA TENTAR REDUZIR O NÚMERO DE HORAS DIANTE DAS TELAS

Não é fácil, porque a cultura eletrônica já está impregnada entre crianças – mas é preciso tentar. Este seria o código de uso ideal – mas é claro que os pais podem aplicar variáveis que sejam melhor aceitas pelos filhos:
Crianças menores de dois anos: o recomendado é evitar que crianças tão pequenas sejam expostas passivamente a telas de qualquer tipo
Crianças entre 2 e 5 anos: o tempo de exposição deve ser de, no máximo, uma hora por dia, com conteúdo de qualidade e supervisionado pelos pais
Crianças a partir de seis anos: no máximo, duas horas por dia, também com supervisão.
Entre os aparelhos mais nocivos à visão estão as telas de LED, pois são as que mais emitem a luz azul.

Dr. Leôncio Queiroz Neto

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