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Conselhos de farmácia

Por Celso Arnaldo Araujo

Com a progressiva implantação das salas de atendimento nas farmácias brasileiras, os farmacêuticos – assim como os demais profissionais do varejo farma – precisam aprimorar sua relação com os clientes que estão em busca de orientações e recomendações. A forma ideal de o cliente tomar um medicamento talvez seja a principal pauta desse atendimento. Como fornecer as informações mais seguras e confiáveis? A Dra. Danyelle Marini, Diretora Tesoureira do CRF-SP, professora-coordenadora dos cursos de Farmácia da FIMI e da UNIFAE e uma das maiores especialistas brasileiras em interação medicamentosa, dá aqui valiosos conselhos aos farmacêuticos que atuam no varejo farma.

Qual é o papel do farmacêutico no processo ainda quase automatizado da dispensação de medicamentos nas farmácias brasileiras?

Quando se fala em processo automatizado, não estamos falando em dispensação, mas em entrega de caixinhas. Essa é a cultura que deve ser mudada. O farmacêutico precisa reconhecer, entre os pacientes que estão sendo atendidos no balcão, quais obrigatoriamente necessitam de um serviço de dispensação com orientação farmacêutica. Além desse serviço, prestado no ato da venda, muitos clientes precisam de acompanhamento para nos certificarmos da eficiência da fármaco-terapia – considerando que nosso grande problema hoje é a falta de adesão ao tratamento. Se o paciente não consegue uma melhora em seus sintomas, geralmente é por falta de adesão.

Um paciente diabético, por exemplo…

Sim, sobretudo o do tipo 1, é um paciente em potencial para ter um acompanhamento farmacológico – processo no qual checaremos a efetividade da dosagem da insulina, por exemplo. Boa parte das dispensações devem incluir alguma orientação – não deve se limitar à entrega do medicamentos ou a questões jurídicas e burocráticas, como os necessários registros dos antimicrobianos na receita. Preciso estar inteiramente atrelado ao paciente para conhecer suas necessidades:

  • Ele sabe para que o medicamento serve?
  • Está ciente das consequências de interromper o tratamento?

Claro que nem todos os clientes de uma farmácia serão atendidos pelo farmacêutico. Mas prescrições de antimicrobianos têm que passar obrigatoriamente pela orientação do farmacêutico. O mesmo acontece com medicações que atuam no Sistema Nervoso Central. No caso de medicamentos de uso contínuo para hipertensão, no mínimo o farmacêutico deve se certificar de que a pressão está sendo controlada. É missão do farmacêutico, com a ajuda dos balconistas, identificar, entre os clientes da farmácia, os que potencialmente, ou obrigatoriamente, exijam uma orientação.

A criação das chamadas “salas de atendimento” vai melhorar o cenário onde é feito o contato entre o cliente e o farmacêutico?

Sim. Nesse ambiente, o farmacêutico estará menos voltado às questões burocráticas e mais para o atendimento do paciente. Para a saúde pública, é a resolução de um enorme problema. Na farmácia, já existe um filtro de prioridades – e isso desafoga o serviço público e os planos de saúde. Há um estudo americano mostrando que, para cada dólar investido em acompanhamento fármaco-terapêutico, você economiza 12 dólares em serviços médicos. Se consigo fazer um hipertenso ter mais adesão ao tratamento, esse paciente tem muito menos risco de enfartar ou ter um derrame.

Claro que nem todo cliente de farmácia vai se enquadrar nesse contexto.

Sim, claro. Haverá os que entrarão em sua farmácia para comprar um velho conhecido: um comprimido para dor de cabeça que ele toma há anos, com sucesso. Ou para resolver transtornos menores, como uma diarreia sem sangramento. Esses não vão procurar o farmacêutico – que, frise-se, deve estar sempre à disposição, para qualquer dúvida. E, para ajudar o profissional nessa tarefa, o CRF oferece uma coleção de fascículos abordando as mais diversas situações, as perguntas que se deve fazer ao paciente diante de cada sintoma e prescrições de MIPs para transtornos menores, além da descrição minuciosa de interações de medicamentos.

Os antibióticos talvez sejam o grupo de medicamentos com maior número de situações, não?

Sim, o cliente que compra um antimicrobiano em sua farmácia precisa saber no mínimo para que ele serve, as consequências de interromper um tratamento no meio, a posologia correta, o modo de tomar, as possíveis interações medicamentosas e as principais reações adversas que recomendariam voltar à farmácia – na chamada “rede de segurança” em volta do paciente. Mas, a partir da orientação inicial, que inclui todos esses aspectos, não será preciso acompanhá-lo, porque o tratamento é um ciclo de 7 a 10 dias.

E o paciente que solicita uma consulta no “consultório” farmacêutico?

Esse é o paciente com os tais “transtornos menores” e que precisam de acompanhamento fármaco-terapêutico, pois seu tratamento é crônico. O objetivo desse acompanhamento: alcançar a efetividade máxima da fármaco-terapia.

E fidelizar o cliente…

Isso é fundamental, para a farmácia também se sentir segura.

Remédio correto, do modo correto: Como tomar medicamentos.

  1. Se o paciente é polimedicamentoso, é preciso verificar se um medicamento está sendo influenciado por outro.
  2. Depois, se eles podem ser tomados juntos – ou cada um num período do dia
  3. Devem ser tomados em jejum? Algum veículo (leite, água, suco) ou tipo de comida interfere em sua ação?

Dicas de saúde:

  • Antimicrobianos não podem ser tomados simultaneamente a anticoncepcionais – que precisam da atividade das bactérias no intestino para se tornar ativo. Ou seja: durante o tratamento com antibióticos, a paciente precisa se valer de outros procedimentos contraceptivos para evitar a gravidez. É grande o número de gestações não desejadas entre mulheres que tomam antimicrobianos. Quem deve orientar a paciente, no caso, é o farmacêutico.
  • Antiparasitários e antifúngicos têm uma interação muito forte com bebidas alcoólicas – o cliente também precisa ser alertado sobre isso
  • Medicamentos que atuam no Sistema Nervoso Central, como diazepínicos, para ansiedade e insônia, também são prejudicados pelo álcool.
  • Captopril (um iECA, inibidor da enzima conversora da angiotensina, usado na hipertensão) perde cerca de 40% de seu poder terapêutico se tomado com alimentos. A amoxicilina também.
  • Ácido fólico (preventivo da má formação fetal) tomado com suco de laranja tem seu efeito aumentado inúmeras vezes.
  • Medicamentos para tireoide devem ser tomados em jejum de pelo menos meia hora – assim como os inibidores da bomba de próton (omeprazol) e os sulfatos ferrosos. Esses produtos precisam de um estômago ácido (vazio) para serem devidamente absorvidos.
  • Já o metronidazol (antiparasitário) age melhor absorvido junto com alimentos gordurosos.

São tantas as interações que é impossível a um farmacêutico conhecer todas – mas é sua obrigação conhecer as básicas. São dois grandes grupos:

1) As interações farmacocinéticas, que envolvem processos de absorção, entrada dos princípios ativos nos vasos sanguíneos e sua distribuição. Quando o medicamento entra na corrente sanguínea, ele está ligado a uma proteína, principalmente a albumina. Dou dois exemplos: o ácido acetilsalicílico (Aspirina) e a varfarina (anticoagulante). Os dois se ligam na mesma proteína plasmática. Quando a Aspirina é ingerida, ela se liga à proteína e deixa a varfarina livre e com efeito aumentado. Resultado: risco maior de sangramento gengival, hematomas na pele, etc. É uma típica interação de distribuição – que pode ocorrer em quem toma varfarina de uso contínuo, vai à farmácia comprar uma Aspirina por causa de uma dor de cabeça – e não pede orientação. Também fazem parte desse grupo as interações por metabolização – medicamentos que competem pela mesma enzima metabolizada no fígado. Exemplos: fenobarbital (anticonvulsivante), fenitoína e carbamazepina (antiepiléticos). A interação entre eles produz maior concentração dos medicamentos na corrente sanguínea, aumentando seu efeito.

2) O segundo grupo é o das interações farmacodinâmicas. Quantos pacientes idosos usam diazepan e começam a ter mais quedas e sonolência? Se estudar esses pacientes, você vai notar que o diazepan reduziu sua expressão e aumentou a quantidade de receptores nos quais o medicamento vai se ligar. Então é preciso reduzir a dose.

Uma instantânea ferramenta de informação 

O farmacêutico precisa decorar tudo isso? Não, mas existe um portal, o SBE (Saúde Baseada em Evidências –http://www.psbe.ufrn.br), financiado pelo Ministério da Saúde, onde o farmacêutico pode entrar com seu CRF e uma senha e ali acionar um programa chamado MICROMEDEX. É uma ferramenta de referências clínicas, cálculo de medicamentos e interações medicamentosas. Se eu digito, por exemplo, varfarina e Aspirina, ele me informa no ato o que pode acontecer no caso dessa interação. Pouquíssimos farmacêuticos utilizam essa arma preciosa e, às vezes, fundamental.

Cronofarmacologia: A hora certa do remédio

Uma nova ciência, no mínimo uma nova cadeira da Farmácia: a Cronofarmacologia estuda a hora mais adequada de tomar os medicamentos, baseando-se no que se sabe do funcionamento do nosso organismo. O horário de ingestão do remédio pode fazer toda a diferença no tratamento, pois pode tanto aumentar sua eficácia como minimizar seus efeitos colaterais. Há antidepressivos que causam sonolência – e por isso exigem o consumo noturno. E outros produzem insônia – e devem ser tomados de manhã. Não há uma regra geral. De novo: a bíblia permanentemente atualizada com todas as recomendações sobre interação medicamentosa, incluindo horários corretos de tomada, está em www.psbe.ufrn.br.

Remédios na gestação: de A a E

Segundo a FDA – a ANVISA norte-americana – os medicamentos utilizados durante a gravidez são classificados pelas cinco primeiras letras do alfabeto, de acordo com seu nível de segurança durante o período. Os do grupo A são os mais seguros. Os do grupo B já foram testados na gestação – como a penicilina, o antibiótico mais recomendado nessa fase. No grupo C, há remédios testados como seguros em laboratório, mas ainda sem comprovação em humanos. Da classificação D em diante, os medicamentos resultam em gestação de risco.

Água, leite?

Há medicamentos que necessitam da acidez do estômago para atingir seu efeito máximo, portanto contraindicam o leite – é o caso do omeprazol. O leite também interfere negativamente com certos antibióticos, como a tetraciclina. São poucos – mas às vezes com efeitos radicais. Por isso, o veículo mais indicado para medicamentos, de maneira genérica, é a água.

Drágeas por xarope: O farmacêutico pode substituir uma prescrição médica?

Não, a menos que consulte o médico prescritor para obter essa autorização. Isso normalmente é feito se o paciente se queixa de dificuldade para engolir sólidos e, por isso, corre o risco de não ter adesão ao tratamento.

Corte do comprimido ao meio: Inteiramente errado

Cortar um comprimido ao meio, por conta própria, é uma decisão arriscada. Além da possibilidade de se produzir duas metades desiguais, eventualmente pode se estar lidando com comprimidos gastro-resistentes – que precisam passar pelo suco gástrico em sua integralidade para fazer efeito.

Dra. Danyelle Marini, Diretora Tesoureira do CRF-SP, professora-coordenadora dos cursos de Farmácia da FIMI e da UNIFAE

 

 

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