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A logística reversa de medicamentos

Comentários ao recente Decreto Federal no 10.388/20, que institui o Sistema de Logística Reversa de Medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso, de uso humano, industrializados e manipulados.

É inquestionável que a promulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei n° 12.305/10, consolidou uma mudança de cenário no que se refere à gestão de resíduos sólidos no Brasil. Baseada na concepção de que poder público, setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações de gestão dos resíduos sólidos, a referida lei estabeleceu a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos como uma de suas premissas. Vale dizer que a logística reversa, compreendida como “um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial,para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada”, passou a ser encarada como um dos principais instrumentos de efetividade da responsabilidade compartilhada.Veja, caro leitor, que a efetivação desse sistema impôs ao legislador a necessidade de definir as obrigações de todos os agentes envolvidos na geração dos resíduos, principalmente no que se refere à coleta, armazenagem, transporte e destinação adequada dos resíduos sólidos. Em relação ao setor farmacêutico, isso ocorreu recentemente, com a publicação do Decreto Federal 10.388/20, que instituiu o Sistema de Logística Reversa de Medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso, de uso humano, industrializados e manipulados, e de suas embalagens após o descarte pelos consumidores. A nosso ver, foi de extrema importância a publicação dessa normativa federal, haja vista que sistemas de logística reversa sem um marco regulatório nacional, com definições de diretrizes gerais, metas, prazos e atribuições de responsabilidades, levam a experiências fragmentadas e pouco efetivas. O que de fato vem ocorrendo no país, dada a profusão de normas estaduais e municipais sobre o assunto, muitas vezes atribuindo apenas às farmácias e drogarias a responsabilidade pela operação, sem observar as diretrizes nucleares da Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS.

Sobre o Decreto Federal no 10.388/20
Ao definir as responsabilidades dos agentes do ciclo de vida dos medicamentos domiciliares, o Decreto Federal 10.388/20 dá concretude ao Princípio de Responsabilidade Compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, alinhado, portanto, a Política Nacional de Resíduos Sólidos, sancionada pela Lei 12.305/2010 e regulamentada pelo Decreto Federal 7.404/2010. De acordo com a norma, os consumidores deverão efetuar o descarte dos medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso e de suas embalagens nas drogarias e farmácias; as drogarias e farmácias estabelecidas como pontos fixos de recebimento ficam obrigadas, às suas expensas, a adquirir, disponibilizar e manter, em seus estabelecimentos, dispensadores contentores; os  distribuidores ficam obrigados, às suas expensas, a coletar os sacos, as caixas ou os recipientes com os medicamentos domiciliares descartados pelos consumidores e transferi-los das drogarias e farmácias; e os fabricantes e importadores de medicamentos domiciliares ficam obrigados a custear a destinação ambientalmente adequada dos medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso descartados pelos consumidores. No que tange à responsabilidade atribuída às drogarias e farmácias, ainda destacamos a obrigação destas em registrar e informar no manifesto de transporte de resíduos a quantidade, em quilogramas, dos medicamentos vencidos ou em desuso descartados recebidos – devendo este ser efetuado antes da transferência dos recipientes do ponto de armazenamento primário até o ponto de armazenamento secundário ou à unidade de tratamento e destinação final ambientalmente adequada, ou seja, antes da coleta externa. Quanto ao objeto, o decreto presidencial estabeleceu que integrarão a logística reversa os medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso, exclusivamente de uso humano – portanto, não compreendem aqueles de uso não domiciliar, os de uso não humano e os descartados pelos prestadores de serviços de saúde públicos e privados. Sobre a estruturação, implementação e operacionalização do sistema de logística reversa de medicamentos, extremamente salutar a opção adotada no ato normativo federal, ao definir que esta ocorrerá de forma gradual,  dividindo em duas fases:

A Fase 1 iniciará na data de entrada em vigor do Decreto, ou seja, em 03.12.2020, compreendendo as seguintes medidas:
a) A instituição de grupo de acompanhamento de performance (GAP) no prazo de 90 dias, constituído por entidades representativas de âmbito nacional dos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, responsável pelo acompanhamento da implementação da logística reversa, cabendo ao ministro de Estado do Meio Ambiente definir as normas e critérios mínimos para estruturação e funcionamento do grupo de acompanhamento de performance.
b) Por intermédio do GAP, a estruturação de mecanismo para a prestação de informações a ser concluído em 90 dias após o item “a)”, por via de relatório anual, referentes ao volume de medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso retornados ao sistema.

Já a Fase 2 iniciará a partir do 120º dia subsequente à conclusão da Fase 1, ou seja, em 03.10.2021, e compreenderá:
a) A habilitação de prestadores de serviço que poderão atuar no sistema de logística reversa de medicamentos, nos termos estabelecidos pelo GAP;
b) A elaboração de plano de comunicação com o objetivo de divulgar a implementação do sistema e qualificar formadores de opinião, lideranças de entidades, associações e gestores municipais com vistas a apoiar a sua implementação; e
c) A instalação gradual e progressiva de pontos fixos de recebimento de medicamentos domiciliares vencidos ou em desuso, de uso humano, industrializados e manipulados, e de suas embalagens após o descarte pelos consumidores, considerando 1 ponto para cada 10 mil habitantes.

A se notar a importância que o Decreto atribuiu às entidades representativas do setor, como a ABCFARMA, para implementação da logística reversa de medicamentos no país. Louvável, portanto, a decisão do governo pela implementação de maneira gradual, visto que possibilita às entidades se organizarem e trabalharem em sinergia, num sistema de cooperação mútua, objetivando um modelo de logística reversa coordenado e funcional, evitando conflitos e rupturas na sua execução.

Outro ponto que merece destaque refere-se à delimitação dos locais – Estados e Municípios abrangidos pela norma, bem como a definição do número de pontos de recebimento proporcional ao número de habitantes. Nesse sentido, visando dar concretude ao sistema, definiu-se que os pontos fixos de recebimento nas farmácias e drogarias serão disponibilizados gradual e progressivamente, de acordo com o seguinte cronograma:

– Primeiro e segundo ano da fase 2 – Nas capitais dos estados e nos municípios com população superior a 500 mil habitantes.
– Do terceiro ao quinto ano da fase 2 – Nos municípios com população superior a 100 mil habitantes. ,

Ao nosso ver, ao estabelecer esses critérios, primou a norma pela sustentabilidade do processo de implantação e operacionalização, tendo por premissa sua viabilidade técnica e econômica, possibilitando um período de amadurecimento para se observar a curva de aprendizagem do sistema de logística reversa de medicamentos no país.

Ressaltamos também que, nos termos do decreto presidencial, os sistemas de logística reversa de medicamentos que estejam em implementação em decorrência de  regulamentos, acordos setoriais ou termos de compromisso de abrangência regional, estadual, distrital ou municipal, deverão observar a prevalência  do decreto federal 10.388, de 2020. Aludida previsão, sem sombra de dúvidas, traz maior segurança jurídica ao promover uma uniformização do assunto, observando o princípio da hierarquia das normas.

Por fim, destacamos que o Decreto prevê a obrigatoriedade de sua avaliação pelo Ministério do Meio Ambiente em até cinco anos, contando da data de entrada em vigor, nos termos do disposto no § 2o do art. 15 do Decreto no 7.404, de 2010, para verificação quanto à necessidade de sua revisão. Diante do exposto, recomendamos aos associados da ABCFARMA que acompanhem o tema através dos canais de comunicação da entidade, reforçando que caberá ao GAP a  definição das diretrizes para estruturação da logística reversa de medicamentos, conforme cronologia estabelecida no Decreto Federal.

Acesse o Decreto Federal no 10.388/20
http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-10.388-de-5-de-junho-de-2020-260391756

Por Dr. Rafael de Oliveira Espinhel

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